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Brasil Memória das Artes
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O teatro de Nelson Rodrigues na visão privilegiada de Foto Carlos

Peças do dramaturgo compõem rico acervo do célebre estúdio fotográfico conduzido por Carlos Moskovics dos anos 40 aos anos 80 no Rio de Janeiro

Os atores Tereza Rachel e Carlos Alberto em 'Bonitinha, mas Ordinária', 1962. Foto Carlos/ Cedoc-Funarte

Os atores Tereza Rachel e Carlos Alberto em 'Bonitinha, mas Ordinária', 1962. Foto Carlos/ Cedoc-Funarte

Em dezembro de 1980, o Brasil perdia o seu maior dramaturgo. Dono de uma trajetória artística singular, que não se ateve a modismos, tendências ou movimentos, Nelson Rodrigues criou um estilo inconfundível, que ao longo dos anos se estabeleceria quase como gênero teatral. O tom superlativo em relação à sua obra nada tem de exagero: Vestido de Noiva, peça do dramaturgo sob direção de Ziembinski em 1943, marcou o surgimento do teatro moderno no Brasil. No ano em que são completadas três décadas da morte do escritor, a Funarte, através do projeto Brasil Memória das Artes, lança um olhar afetivo sobre o acervo que possui, com fotos de montagens de espetáculos teatrais, programas de peças e depoimentos do autor.

O passeio pelo acervo referente a Nelson Rodrigues no Brasil Memória das Artes será periódico e tem início a partir de uma parceria bastante frutífera, com o registro, de apuro estético incontestável, das lentes do fotógrafo Carlos Moskovics – do lendário Estúdio Foto Carlos – para montagens teatrais célebres do dramaturgo. Através do projeto Brasil Memória das Artes, o acesso a tais imagens históricas ficou mais fácil: depois de digitalizar, em 2006, 19.839 imagens de espetáculos teatrais dos mais variados encenadores, atores e autores, cujos negativos estavam inacessíveis, o projeto voltou-se novamente para a Coleção Foto Carlos em 2009, recuperando mais 19 mil negativos de atividades teatrais realizadas entre 1943 e 1974.

Imagens de Nelson Rodrigues e da irmã em cena

No acervo referente a Nelson Rodrigues, é impossível não se surpreender com imagens que retratam a única participação do escritor em uma de suas peças: em Perdoa-me por me Traíres, ele aparece deitado no colo da atriz Sônia Oiticica. A montagem, de 1957, ocupou o Teatro Municipal, e um ano depois, o Teatro da Praça, hoje conhecido como Teatro Gláucio Gill. Perdoa-me por me Traíres, a história de uma órfã adolescente que vive sob a repressão de um casal de tios, que no fim descobre ser fruto de um incesto, causou enorme polêmica na cena carioca em sua temporada de estreia.

Da família fictícia para a da vida real, uma imagem de alto teor dramático registra cena da irmã de Nelson Rodrigues, Dulce, ajoelhada, aos prantos, no espetáculo Valsa nº 6, encenado também no Rio de Janeiro, no Teatro Serrador, em 1951, sob direção de Henriette Morineau. O monólogo, escrito especialmente pelo autor para a irmã, acompanha uma jovem de 15 anos, golpeada mortalmente, que recupera, em estado de choque, a consciência do mundo à sua volta. Como strong>Carlos Moskovics não se limitava a registrar apenas fotos de cena, é possível ver um flagra do acervo com Henriette dirigindo Dulce Rodrigues na montagem.

A irmã de Nelson encenaria ainda A Mulher sem Pecado, em montagem que ocupou o Teatro Serrador em 1957 sob direção de Rodolfo Mayer. No acervo da Coleção Foto Carlos, é possível encontrar imagens em que a irmã do dramaturgo aparece abraçada ao ator Jece Valadão, com quem estava noiva à época. A peça, cuja ação é norteada pelo ciúme excessivo de um marido por sua segunda mulher, foi o primeiro texto teatral escrito por Nelson Rodrigues e teve uma primeira encenação realizada em 1942.

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A paixão do dramaturgo pela mãe de Nicette Bruno

Seis anos depois, em 1948, uma peça teatral em três atos, montada no Teatro Fênix, sob a batuta de Ziembinski, causaria escândalo ao tocar no tema do preconceito racial: Anjo Negro, liberada após censura religiosa inicial, marcaria a estreia do Teatro Popular de Arte, de Maria Della Costa e Sandro Polloni. A beleza de Della Costa pode ser observada num dos registros da Coleção Foto Carlos para a peça, em que o ator Orlando Guy lhe beija as mãos. Outra fotografia de forte apelo dramático, em que ela aparece por trás dele, reúne o ator e a atriz Nicette Bruno. À época, Nicette era ainda adolescente e entrara no elenco devido à saída de Della Costa para estrelar outra montagem. A mãe de Nicette, a cantora lírica Eleonor Bruno, acompanhava a filha nos ensaios e acabou atraindo a atenção de Nelson Rodrigues. Impressionado por sua beleza, o dramaturgo conseguiria conquistá-la escrevendo-lhe cartas apaixonadas e brindando-a com uma peça escrita especialmente para ela: Dorotéia estrearia em 1950 sob direção do onipresente Ziembinski, com Eleonor Bruno no papel-título. Em foto da peça presente na Coleção Foto Carlos, a atriz, dona de um olhar misterioso, aparece na montagem usando um blazer preto sobre camisa branca.

A Zona Norte carioca chega aos palcos

Em 1953, A Falecida reuniria elenco promissor em montagem no Teatro Municipal registrada pelas lentes do Estúdio Foto Carlos. Uma das fotos mostra os atores Sérgio Cardoso e Sônia Oiticica em momento quase operístico, com a atriz, quase de joelhos, se amparando no ombro do ator. Os dois aparecem novamente juntos, desta vez ao lado do ator Leonardo Villar, que se destaca na imagem, autor de uma gargalhada contagiante. A Falecida, primeira tragédia carioca de Nelson retratando a Zona Norte do Rio de Janeiro, foi encenada por José Maria Monteiro, com a Companhia Dramática Nacional.

Em 1960, Carlos Moskovics voltaria a fotografar outra peça de Nelson Rodrigues em que o autor se debruçava sobre tipos da Zona Norte carioca. Em Boca de Ouro, Milton Moraes dava vida a um bicheiro cafajeste, flagrado pelas lentes do Estúdio Foto Carlos com Beatriz Veiga e Ivan Candido; e prestes a saborear a bebida servida a ele no copo de plástico por Vanda Lacerda. As imagens explicitam o rigor na criação dos figurinos na montagem dirigida por José Renato, um dos fundadores do Teatro de Arena.

Nudez, sexo e outras polêmicas rodriguianas

Dois anos depois, em 1962, seria a vez de o Teatro Maison de France receber uma montagem de Bonitinha, mas Ordinária dirigida por Martim Gonçalves. Entre as imagens da peça feitas pelo fotógrafo Carlos Moskovics há preciosos registros de cenas, como a em que Tereza Rachel aparece amparada por Carlos Alberto, com figurino revelador: um vestido preto de decote generoso, com as alças da lingerie aparentes. Os atores Sebastião Vasconcelos e Lea Bulcão também foram fotografados em cena de assassinato, de grande impacto. Outro registro de forte apelo dramático reúne boa parte do elenco observando a cena do crime. Em Bonitinha, mas Ordinária, o foco está na dúvida de um rapaz humilde entre se casar com a filha de um magnata, vítima de um estupro, ou se manter fiel ao sentimento que tem por uma prostituta que sustenta mãe e três irmãs; papel de Tereza Rachel, aclamada por seu desempenho.

Uma das grandes damas do teatro brasileiro, Cleyde Yáconis protagonizou, em 1965, a montagem de Toda Nudez Será Castigada, mais uma de Nelson Rodrigues dirigida por Ziembinski, lembrada por uma peculiaridade: para interpretar a protagonista Geni, algumas atrizes foram consultadas, mas recusaram-se a viver a prostituta que trai seu amante, um homem conservador, com o filho dele. Cleyde se entregou ao papel de corpo e alma, como demonstram algumas das belas imagens captadas pelo Estúdio Foto Carlos, em que ela aparece na cama com Nelson Xavier; de camisola ao lado de Ênio Gonçalves; e de perfil, com Elza Gomes. A montagem foi mais uma a ocupar o Teatro Serrador.

Nelson ficaria oito anos sem escrever para teatro, até dar corpo a Anti-Nelson Rodrigues, de 1973, texto que, ao contrário dos anteriores, dá um final feliz aos protagonistas. A atriz Neila Tavares foi a responsável por convencer o dramaturgo a escrever a peça especialmente para ela e integra o acervo da Coleção Foto Carlos em imagem em que aparece ao lado do ator José Wilker. Diretor da montagem, o ator Paulo César Pereio pode ser visto em foto com a atriz ao lado de Iara Jati e de Neila Tavares. Outro flagrante apresenta o ator Carlos Gregório se admirando no espelho.

Imagens de montagens de ‘Vestido de Noiva’

A mítica Vestido de Noiva, que em 28 de dezembro de 1943 estrearia sob aplausos entusiasmados com o grupo Os Comediantes sob direção do polonês Ziembinski – mais frutífera e celebrada parceria de Nelson Rodrigues –, surpreenderia pelo enredo ousado, que dividia a ação em três planos: a memória, o coma e o real, o que permitia que o público tivesse acesso à complexa psique da personagem central, Alaíde, mulher que, delirante sob uma mesa de operação, acredita estar vestida de noiva. A traição entre irmãs e o forte apelo pela vida mundana norteiam a trama, que teve algumas montagens registradas pelas lentes do fotógrafo Carlos Moskovics. No acervo, é possível encontrar fotos da montagem de 1943, que entre 1945 e 1946 voltaria a ganhar os palcos novamente com Os Comediantes, e também de uma montagem de 1965 dirigida por Sergio Cardoso, que aparece sentado, em pose calculada, segurando seus óculos.

Os registros da montagem de 1965 são de forte apelo visual: neles, pode-se observar desde o elaborado cenário a flagrantes de cenas da protagonista, Alaíde, então vivida por Yoná Magalhães. Moskovics não se limitou, contudo, a registrar somente fotos da encenação e documentou também os ensaios. As fotos que acompanham a preparação do elenco exibem o cenário ainda inacabado e registros com a presença do ator John Herbert, intérprete de Pedro, homem disputado por duas irmãs.

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PACCELLE FIGUEIREDO

enviado em 2 de abril de 2011

MARAVILHOSO… A HISTORIA DESSE SER ENCANTADOR,MISTERIOSO,FANTASTICO E DIGNO DE TODAS AS HONRAS NAO PODE SE PERDER JAMAIS.

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